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A OVELHINHA
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Página 1 de 1
A OVELHINHA
Era uma ovelha tresmalhada. Perdera-se do rebanho,
quando lhe deu a sede e foi à cata de água nem ela sabia
onde. Lembrava-se de ter bebido de uma poça
acrescentada pelas chuvas. Mas isso fora dias atrás e,
entretanto, a água naturalmente secara do tanto calor que
fazia.
Desorientou-se. Eram tantas as oliveiras e azinheiras em
redor, todas iguais, espalhadas pelos outeiros, que, para
qualquer lado que se virasse, a paisagem não lhe dava sinal
de orientação.
Apurou o ouvido, à espera de um balido ou de um soar
de guizos das companheiras. Nada. Só o vento, um
ventinho leve, bulindo nas folhas, agitando os ramos,
levantando tufos queimados de cardos, que rolavam na
secura do chão como num deserto.
Arrependeu-se da aventura. Ainda há pouco, tão em
sossego com as outras do rebanho, tasquinhando uns restos
de ervas, no remanso de uma sombra entre rochedos. Mas
apetecera-lhe experimentar uma verdura desconhecida e
saíra-se mal da prova. Era amargosa a planta, arranhava a
boca, puxava à água. Pois sim, mas onde encontrá-la,
naquela desolação?
Bem a tinha avisado, em tempos, a avó, ovelha ruça e
experiente:
– Pasta só o que as outras pastam. Nunca te apartes do
rebanho.
Bons conselhos eram, mas à ovelhinha nova dava-lhe
raiva seguir na pisada das que, antes dela, deixavam a erva
ceifada pela raiz. Com que sobras mataria a fome? Que
pena a avó já não pertencer ao rebanho, para lhe perguntar.
Fome e sede era o que sentia, agora, naquele ermo.
Ia a atrever-se pela boca de uma gruta, na base de um
cabeço, mas teve medo. Havia de estar fresco, lá dentro.
Talvez gotejasse, a escorrer das paredes, humidade que
bastasse à sua sede. Talvez encontrasse ração de ervas frescas
e doces. À medida da sua fome.
Mas também podia enfrentar surpresas desagradáveis,
acoitadas no escuro. Cobra, sardão ou bicho pior, sabe-se
lá se lobo, dos muitos que a ovelhinha conhecia das
histórias, contadas, à noite, no redil, pelas mais velhas do
rebanho.
A ovelha tresmalhada arrepiou-se toda e com o arrepio
soltou o primeiro balido, a pedir socorro.
Os cães haviam de ouvi-la, se a não ouvissem os pastores,
garotos ainda, decerto entretidos a jogar às pedrinhas
ou a brincar ao agarra.
O vento apagou-se, num repente. As cigarras calaram-se.
Tudo mergulhou num grande silêncio. Aproveitando-o, a
ovelha gritou mais alto o seu susto.
Foi quando uma grande nuvem, cerrada e imprevista,
tapou o Sol. A sombra que estendeu sobre a terra fez crer
que, de súbito, o dia terminara. A ovelha não sabia as horas,
mas admirou-se que tão depressa descesse a noite. Mais se
assustou. Mais baliu.
Não demorou muito a cerração. A cortina do céu
rompeu-se e um feixe de luz desceu sobre aquele recanto
recolhido do mundo.
Atraída pelo leve clarão, que caía mais adiante, numa
mata de azinheiras, a ovelha correu, esquecida do medo
que ainda há pouco a paralisara.
Ouviu vozes. Viu o rebanho. Enfim.
Cessavam os sobressaltos. Tudo se recompunha em boa
paz. O seu coração humilde podia, de novo, bater mais
tranquilo. Ela já não era uma ovelha tresmalhada.
FIM
3
quando lhe deu a sede e foi à cata de água nem ela sabia
onde. Lembrava-se de ter bebido de uma poça
acrescentada pelas chuvas. Mas isso fora dias atrás e,
entretanto, a água naturalmente secara do tanto calor que
fazia.
Desorientou-se. Eram tantas as oliveiras e azinheiras em
redor, todas iguais, espalhadas pelos outeiros, que, para
qualquer lado que se virasse, a paisagem não lhe dava sinal
de orientação.
Apurou o ouvido, à espera de um balido ou de um soar
de guizos das companheiras. Nada. Só o vento, um
ventinho leve, bulindo nas folhas, agitando os ramos,
levantando tufos queimados de cardos, que rolavam na
secura do chão como num deserto.
Arrependeu-se da aventura. Ainda há pouco, tão em
sossego com as outras do rebanho, tasquinhando uns restos
de ervas, no remanso de uma sombra entre rochedos. Mas
apetecera-lhe experimentar uma verdura desconhecida e
saíra-se mal da prova. Era amargosa a planta, arranhava a
boca, puxava à água. Pois sim, mas onde encontrá-la,
naquela desolação?
Bem a tinha avisado, em tempos, a avó, ovelha ruça e
experiente:
– Pasta só o que as outras pastam. Nunca te apartes do
rebanho.
Bons conselhos eram, mas à ovelhinha nova dava-lhe
raiva seguir na pisada das que, antes dela, deixavam a erva
ceifada pela raiz. Com que sobras mataria a fome? Que
pena a avó já não pertencer ao rebanho, para lhe perguntar.
Fome e sede era o que sentia, agora, naquele ermo.
Ia a atrever-se pela boca de uma gruta, na base de um
cabeço, mas teve medo. Havia de estar fresco, lá dentro.
Talvez gotejasse, a escorrer das paredes, humidade que
bastasse à sua sede. Talvez encontrasse ração de ervas frescas
e doces. À medida da sua fome.
Mas também podia enfrentar surpresas desagradáveis,
acoitadas no escuro. Cobra, sardão ou bicho pior, sabe-se
lá se lobo, dos muitos que a ovelhinha conhecia das
histórias, contadas, à noite, no redil, pelas mais velhas do
rebanho.
A ovelha tresmalhada arrepiou-se toda e com o arrepio
soltou o primeiro balido, a pedir socorro.
Os cães haviam de ouvi-la, se a não ouvissem os pastores,
garotos ainda, decerto entretidos a jogar às pedrinhas
ou a brincar ao agarra.
O vento apagou-se, num repente. As cigarras calaram-se.
Tudo mergulhou num grande silêncio. Aproveitando-o, a
ovelha gritou mais alto o seu susto.
Foi quando uma grande nuvem, cerrada e imprevista,
tapou o Sol. A sombra que estendeu sobre a terra fez crer
que, de súbito, o dia terminara. A ovelha não sabia as horas,
mas admirou-se que tão depressa descesse a noite. Mais se
assustou. Mais baliu.
Não demorou muito a cerração. A cortina do céu
rompeu-se e um feixe de luz desceu sobre aquele recanto
recolhido do mundo.
Atraída pelo leve clarão, que caía mais adiante, numa
mata de azinheiras, a ovelha correu, esquecida do medo
que ainda há pouco a paralisara.
Ouviu vozes. Viu o rebanho. Enfim.
Cessavam os sobressaltos. Tudo se recompunha em boa
paz. O seu coração humilde podia, de novo, bater mais
tranquilo. Ela já não era uma ovelha tresmalhada.
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